Edição de Maio de 2001
O Fogo
Instalações solares térmicas

por Fausto Simões
   
Tendo em atenção os nocivos efeitos, resultantes do abuso de equipamentos, designadamente dos que dependem directa ou indirectamente dos combustíveis fósseis, será sensato, como se referia no primeiro artigo desta série, «aproveitar directamente a energia do Sol [...] para aquecer a água dos nossos banhos e para produzir a energia que alimentará os electrodomésticos que hoje não dispensamos».
Pedimos a um especialista em energia solar, há longos anos empenhado na sua investigação e aplicação, que nos fizesse uma súmula do que de mais relevante há a considerar, se pretendermos fazer esse aproveitamento, de forma consequente, em instalações domésticas dedicadas.
 
   

O Sol é a fonte de radiação que torna possível a vida na Terra. A radiação solar pode ser aproveitada de forma passiva ou por meios activos. A sua utilização passiva foi abordada no anterior artigo sobre o Ar e o Fogo.

 

 


O sol como fonte de energia

 

Trataremos agora do seu aproveitamento por meios activos. Entendemos por activa, a transformação da radiação em energia térmica ou eléctrica, por intermédio de equipamentos dedicados: os colectores solares térmicos e os painéis fotovoltaicos.
Os colectores solares térmicos aquecem água a partir do sol. Os painéis fotovoltaicos convertem a energia solar em energia eléctrica por meio do efeito fotovoltaico.
Neste artigo faremos uma introdução à conversão térmica (activa) em sistemas de aquecimento de água sanitária, deixando para o seguinte a «produção» de energia em pequenas instalações domésticas que podem ser integradas nas casas de Portugal.

 

 


Conversão térmica da energia solar

 

O aproveitamento da energia solar por conversão em energia térmica a baixa temperatura é interessante para a produção de água quente até 60ºC, com períodos mínimos de utilização do equipamento solar de oito a 10 meses por ano. As aplicações mais frequentes são:
- Produção de Água Quente Sanitária (AQS);
- Aquecimento de piscinas;
- Aquecimento ambiente com piso radiante.
Em geral, os equipamentos solares não garantem a totalidade do consumo energético. Portanto, é sempre necessário o apoio de uma instalação convencional que assegure as necessidades energéticas não cobertas pelo sistema solar.
As instalações solares dimensionam-se para um ano médio, evitando os excedentes energéticos dos meses de Verão.


Prioridade ao sol!
O consumo energético deve realizar-se prioritariamente com a energia solar, só se recorrendo à energia de apoio quando não houver «sol». O sistema de armazenamento deve garantir o uso prioritário da energia solar face à convencional.
No colector, a luz do Sol atravessa o vidro e chega à chapa de absorção. Esta aquece e emite radiação com um comprimento de onda maior, para o qual o vidro é opaco, não conseguindo escapar para o exterior
Este último fenómeno é conhecido como efeito de estufa.

A instalação solar pode ficar perfeitamente integrada na arquitectura
 

 


Colector solar

 

Um colector plano é formado pela cobertura, a placa de absorção e uma caixa isolada para evitar as perdas de calor. À placa de absorção solda-se uma serpentina de tubos pelos quais circula o fluido.
O modelo de colector solar para aquecimento de piscinas é mais simples do que os descritos atrás, já que não tem cobertura de vidro. Basicamente, é formado por tubos de plástico pelos quais circula a água da piscina. Dado que não funciona com efeito de estufa, o ganho térmico limita-se a 20ºC sobre a temperatura ambiente. O interesse deste tipo de colector reside no facto de ser barato e de ter um bom rendimento a baixas temperaturas, sendo o mais aconselhado para aquecimento de piscinas.

 

 


Fluido de transferência térmica

 

É o fluido que circula dentro do elemento de absorção e que transfere à outra parte do sistema a energia térmica absorvida. Utiliza-se como fluido térmico água ou uma mistura de anticongelante e água para proteger os colectores da congelação, da corrosão e das incrustações.
O rendimento do colector diminui à medida que a temperatura da água sobe.
Como regra geral deve escolher-se o colector de acordo com a temperatura de utilização pretendida, de forma a que o seu rendimento seja superior a 40 por cento.

 

 


Orientação e inclinação dos colectores e sombras

 

Os colectores devem ser instalados de forma a aproveitar o máximo da radiação solar incidente. Orientam-se ao sul geográfico, não coincidente com o sul magnético definido pela bússola (há uma diferença de cinco graus). O sul geográfico pode determinar-se pela sombra projectada por uma vara às 12 horas solares (meio-dia solar, o qual não coincide com o tempo legal).
Por vezes, a cobertura, sendo inclinada, não tem a orientação e a inclinação ideais. Nesses casos é necessário estabelecer um compromisso entre a eficiência e a estética:
- Uma estrutura para colocar os colectores não paralelos ao telhado é normalmente inestética;
- A colocação dos colectores paralelos ao telhado pode não representar uma grande penalização.
Desvios até 20 graus relativos à orientação a sul não afectam gravemente o rendimento e a energia térmica fornecida pelo equipamento solar; se forem maiores, pode-se aumentar até certo ponto a área de colectores, obviamente com um sobrecusto inicial.
O instalador deve fornecer ao cliente os elementos que lhe permitam escolher o melhor compromisso. Os colectores solares devem ser instalados em local sem sombras de construções ou árvores próximas, existentes ou possíveis... o que na nossa terra é problemático porque não está consagrado na lei o «direito ao sol»!

Monobloco bem integrado
 

 


Depósitos e sistemas de circulação

 

O calor captado pelos colectores tem que ser transferido para um depósito isolado, para ser utilizado quando for necessário.
A transferência do calor captado pelos colectores pode realizar-se por circulação natural (termossifão), quando for possível colocar o depósito acima dos colectores, ou por circulação forçada com uma bomba, quando tal não for possível.
A circulação por termossifão, aconselhável para pequenas instalações, é um sistema auto-regulado e isento de partes mecânicas ou controlos electrónicos, pelo que a instalação é mais barata e não está sujeita a avarias mecânicas.
A permuta de calor entre o circuito primário e o secundário pode realizar-se por transferência directa ou indirecta. No primeiro caso, a água aquecida nos colectores é enviada directamente para consumo. Na transferência indirecta é utilizado um permutador de calor que permite separar a água de consumo do fluido térmico de transferência. O sistema fica protegido contra a congelação, a corrosão e os depósitos de calcário, sendo por isso a solução mais utilizada.
No depósito solar interessa fomentar a estratificação de forma a que, para a utilização, a água vá mais quente e os colectores funcionem sempre que possível à temperatura da rede.
Para uma boa estratificação é preferível o depósito estar «ao alto» e existem dispositivos (por exemplo, uma «bengala») que evitam que a água da rede se misture imediatamente com a água quente do depósito, destruindo a estratificação da temperatura.
O isolamento térmico e a colocação do depósito, se possível dentro de casa, são factores que minimizam as perdas.
A colocação do depósito ao baixo, no exterior, pode ser uma solução interessante sobretudo pelos aspectos estéticos e pela facilidade e custo da montagem.
Nas figuras 2 e 3 estão representados dois sistemas com circulação por termossifão. Na Fig. 2 o sistema energético de apoio é realizado mediante uma resistência eléctrica dentro do depósito. Na Fig. 3 o apoio é feito por um esquentador de chama variável em função da temperatura de entrada da água. Não se pode colocar em série um esquentador convencional (sem modulação de chama), já que a temperatura de saída da água do depósito pode ser elevada.
Os esquemas seguintes, com sistemas de circulação forçada, têm dois elementos necessários para melhorar a eficiência energética do sistema: uma válvula misturadora termostática de três vias (VM), que prepara a água para o consumo a uma temperatura definida previamente (40ºC-45ºC), e a «bengala» para melhorar a estratificação.
Se a instalação tiver um vaso de expansão aberto, este deve ser ligado à aspiração da bomba e colocado a um nível superior ao dos colectores.
Uma solução muito interessante é a combinação de um sistema solar e de uma lareira com recuperador de calor.
No caso de instalações um pouco maiores, por exemplo em turismo de habitação, pode haver necessidade de alimentar diversas casas de banho relativamente afastadas, sendo necessário um anel de água quente. Nestes casos é necessário assegurar que o anel não põe em causa a «prioridade ao sol». O retorno do anel nunca deve ser ao depósito solar.
O anel de água quente foi dotado de dois dispositivos para permitir a paragem da circulação. Um deles é um termóstato que desliga quando o retorno estiver a mais de 35ºC e o outro é um relógio que interrompe a circulação a partir de certa hora.
No caso do aquecimento de piscinas, o permutador convencional está instalado em by-pass para, em função do grau de abertura ou fecho da válvula, diminuir as perdas de carga associadas ao permutador. O permutador solar tem uma válvula misturadora de três vias para T1 não ultrapassar os 30ºC (temperatura máxima na piscina) na saída do permutador.

Colector integrado numa habitação rural
Os painéis fotovoltaicos convertem a energia solar em energia eléctrica
Fig. 2
Fig. 3
Fig. 4 – Instalação solar com vaso de expansão fechado
Fig. 5 – Instalação solar com recuperador de calor de lareira
 

 


Situações a evitar nas instalações solares térmicas

 

Há uma série de situações que aparecem com certa frequência e que devem ser tidas em consideração para se poder assegurar o sucesso da instalação solar:

- Dimensionamento da instalação
Um motivo de insatisfação é o facto de a instalação não ter o rendimento esperado. Uma causa do problema pode ser um consumo de água quente superior ao previsto inicialmente. É necessário conhecer com alguma exactidão os consumos de água quente para poder dimensionar adequadamente a área de captação.
A colocação de um contador volumétrico do caudal de água permite conhecer-se o consumo real, representando uma garantia para o instalador e para o cliente.

- Depósito com resistência eléctrica no seu interior
O aquecimento eléctrico não é muito recomendável; no entanto, a existência de tarifa bi-horária pode torná-lo interessante em horas de vazio.
Neste caso, a resistência eléctrica deve ser colocada na parte superior do depósito, para evitar a mistura entre a água aquecida pela instalação solar e pela resistência. Para além do termóstato, o comando da resistência deve ter um relógio programável para impedir o aquecimento eléctrico no período diurno.
Se isto não for respeitado, teremos um sistema eléctrico «mascarado» de solar, contrariando o princípio da «prioridade ao sol».

Fig. 6
Fig. 7 – Instalação solar para aquecimento de piscinas
 

 


Análise económica

 

As fontes convencionais de energia voltaram a sofrer grandes aumentos: por exemplo, o butano (13 kg) passou de 1800$00 para 2600$00 e o propano (45 kg) passou de 7500$00 para 10 500$00. Tendo em consideração estes custos, uma instalação doméstica apresenta tipicamente os seguintes valores:

 

 


Incentivos e subsídios

 

No cálculo do IRS (pessoas singulares) é possível uma dedução à colecta de 100 ou 120 contos desde que não haja empréstimos à habitação, pois a rubrica é a mesma.
Para pessoas colectivas – caso de unida-des hoteleiras, de turismo de habitação ou rural –, as instalações de energias renováveis podem ser actualmente amortizadas em quatro anos (em vez de 12) e são possíveis candidaturas às Medidas de Apoio ao Potencial Energético (MAPE) do Programa Operacional Economia (POE), com subsídios até 40 por cento.

Sistema de confecção de alimentos activado por reflector solar
 
                                   
Algumas noções básicas

Efeito de estufa

Um corpo exposto ao sol aquece. Simultaneamente, há perdas energéticas que aumentam com a temperatura.
Chega um momento em que as perdas térmicas igualam os ganhos, atingindo-se a temperatura de equilíbrio. Se conseguirmos extrair continuamente uma parte do calor produzido mudaremos as condições do equilíbrio anterior.


Corpo negro

O corpo negro absorve toda a radiação incidente mas é também aquele que, a uma dada temperatura, consegue emitir mais energia por radiação. Como consequência, absorve energia com um comprimento de onda entre 0,25 e 2,5 mícron e emite-a entre 3,9 e 39 mícron (exemplo do espectro emitido a 100° C). Assim, a radiação transforma-se em energia térmica e será aproveitada se fizermos circular um fluido. Para a captação solar interessa-nos um corpo que absorva como um corpo negro e emita pouco, nascendo aqui o conceito de superfície selectiva.


 
 

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