Ethan Frome

 

 

Caracterizaçăo e Avaliaçăo do Clima

Fausto Simões

Orbis, Email Orbis@netc.pt

 

1. Definição e Caracterização do Clima

A Atmosfera é uma fina película gasosa que envolve a Terra: Cerca de 99% da sua massa confina-se a uma camada com cerca de cinco milésimos do raio da Terra.

O Tempo pode definir-se como sendo o estado da atmosfera num local e num dado momento.

O Clima pode entender-se como uma peculiar sucessão de estados de tempo que se verifica num local e num período determinado.

O Clima como o Tempo, está marcado pela diversidade e pela mudança que decorrem da natural instabilidade da Atmosfera.

Factor determinante dessa instabilidade é o Sol, ou melhor, a inclinação dos raios solares que varia com a latitude e, em cada latitude, ao longo do ano. A palavra grega K l i m a (Clima), na sua origem referida a uma zona da Terra entre duas latitudes, associa-se etimológicamente à inclinação dos raios solares.

As variações do Tempo, constatamo-las facilmente na nossa vida quotidiana ou nos boletins meteorológicos publicados nos jornais diários.

Quanto ás variações do Clima, também facilmente nos apercebemos, da sua diversidade; por exemplo, de que o clima da Guarda é mais frio do que o de Lisboa, mas menos do que o de Oslo. Já não é tão evidente o sentido da evolução do clima dos locais em que vivemos. Estudos de Meteorologia e de Climatologia, levam a admitir que, numa vasta região do Globo que inclui a Europa, após a pequena idade glaciar nas imediações do século XVII, a qual pôs termo a um período medieval quente, se processou um aquecimento até cerca de 1950, seguindo-se um periodo hesitante de extremos, em que hoje vivemos.

A constatação da diversidade climática deu azo a tentativas de classificação, agrupando em grandes classes a miríade de climas afins que se verificam no mundo. Uma das mais largamente utilizadas e revistas é a de W. Köppen que se serve da correspondencia entre a distribuição da vegetação e o clima para estabelecer as zonas climáticas.

A versão de Trewarta e Horn apresenta 7 grupos climáticos : (A) Tropical Húmido, (B) Seco, (C) Subtropical, (D) Temperado, (E) Boreal, (F) Polar, (H) Altitude. Estes grupos dividem-se em subgrupos.

Seguindo a classificação de Köppen o território do continente português cai na zona (C), sugrupo (s) que se distingue pela ocorrência da estação seca no verão, repartindo-se pelo tipo (a) caracterizado por verão quente, predominante a sul e, pelo tipo (b) caracterizado por verão pouco quente, predominante a norte. Uma pequena mancha de clima de Altitude ocorre na Serra da Estrela (Fig. 1).

Fig. 1 Regiões Climáticas de Portugal Continental segundo Köppen

Trata-se de uma classificação muito grada a que escapam situações que só uma analise mais fina pode detectar. De facto, são muitos os factores que interferem no clima, desde a latitude à simples orientação de uma encosta, incluindo a intervenção do homem no meio(Quadro 1).

Quadro 1. Factores que interferem no Clima segundo Grogger (Watson, 1983)

Elem. Climáticos

Latitude

Altitude

Relevo

Topogr

Dist. água

Vegetação

Urbaniz.

Total

Nebulosidade

8

5

9

2

6

3

6

39

Insolação

8

4

6

6

5

10

8

47

Radiação Solar

9

5

6

8

5

10

8

51

Vento

5

5

8

7

7

7

7

46

Temperatura

11

6

5

6

8

9

9

54

Humidade Relat

7

2

5

7

8

9

9

47

Evapotransp

8

4

1

5

5

7

10

40

Albedo

2

1

2

5

4

6

7

27

Precipitação

7

4

8

1

9

5

4

38

Total

65

36

50

47

57

66

68

Nota: A importancia dos factores está graduada numa escala de 0 (irrelevante) a 12 (muito importante)

 

Refere-se, pela sua relevância urbanística, o efeito de ilha de calor urbana, resultante de uma intervenção humana incontrolada e que parece dever-se sobretudo à impermeabilização do solo.

Ao pretendermos caracterizar o clima de um local, deparamo-nos com dificuldades que decorrem das mudanças de tempo, as quais são superiores ás mudanças climáticas que podemos detectar. Mudanças ciclicas, de ciclo diário, anual, como a sucessão das estações do ano e outras mudanças extemporaneas, mas apesar de tudo esperadas, como o verão de S. Martinho. Outras completamente inesperadas e excessivas.

Enfim, não há dois anos iguais...e, no entanto, existem regularidades que caracterizam o clima local, inclusivé nos seus excessos. Estas regularidades podem traduzir-se em médias ao longo de um determinado período e incluir os extremos nesse período, para caracterizar o clima. E assim se estabeleceram as Normais Climatológicas para um período de 30 anos consecutivos, numa reunião da Comissão de Climatologia da Organização Meteorológica Mundial havida em Varsóvia, 1933. Para considerar a evolução do clima, este período é ajustado todos os dez anos, substituindo-se a primeira década pela década que entretanto decorreu.

O termo Normal não implica pois que o clima seja estático. Elementos do clima como a temperatura do ar seguem, na sua distribuição estatística, a curva de Gauss, o que significa que o valor médio que pode nunca ocorrer (!) é, também mediano: Isto é, metade dos anos estão para cima e a outra para baixo.

Incluindo-se não só os valores médios mas também os extremos, a ocorrência, por exemplo de um verão excepcionalmente quente, pode não ser anormal se cai na esperada variação das temperaturas de verão.

As Normais Climatológicas são preparadas e publicadas pelo Instituto de Meteorologia e Geofísica, onde podem ser consultadas e obtidas estas publicações bem como outras específicas, tais como registos anuais de temperatura, humidade, radiação.

 


2. Avaliação do Clima

A análise crítica dos dados climáticos em função das necessidades humanas, envolve selecção e tratamento diferenciados: Agricultura, produção de energia, prevenção de riscos, turismo, têm critérios próprios e distintos.

Assim acontece também com o conforto térmico que, no RCCTE se remete simplesmente, na estação fria para uma temperatura do ar de 18șC no limite inferior da zona de conforto e, na estação quente para 25șC, no limite superior dessa zona.

A temperatura de 18șC, ou melhor, de 15șC descontando-se 3șC correspondentes ganhos solares e internos correntes, é a temperatura de referência para os graus-dia, segundo os quais o país é dividido em três zonas climáticas de inverno. Já quanto ao verão, é o percentil 97.5% das temperaturas alcançadas entre Junho e Setembro que serve de referência para a classificação do país em três zonas de verão, mas usam-se os 25șC para o cálculo do consumo de energia.

Loftness (1982) compilou um conjunto de métodos de análise do clima segundo critérios de conforto térmico. Pode utilizar-se para o efeito, o Diagrama Psicrométrico, demarcando a zona de conforto e, representando o clima local por pontos de estado correspondentes a pares de temperatura e de humidade mensais ou mesmo horários. A distribuição destes em relação à zona de conforto faz transparecer o cariz favorável ou desfavorável do clima local, podendo mesmo ler-se a forma como ele se reparte por períodos confortáveis e desconfortáveis, com o detalhe permitido pelos pontos introduzidos no diagrama.

Não sendo facil obter os dados climáticos que este método requer, pode recorrer-se a um método expedito como o que a seguir se descreve.

Esta avaliação expedita não só pode contribuir para a sensibilização ás particularidades climáticas locais relacionadas com o conforto térmico, mas também, graças à sua quantificação, embora simples, pode servir de base à pré-selecção das estratégias bioclimáticas mais adequadas ás condições climáticas locais.

 


3. Avaliação Climática Expedita

3.1. Critérios de Avaliação e sua Justificação

De harmonia com o caracter expedito da avaliação adianta-se a grelha de avaliação que consta do quadro 2, cuja escala se ajusta ao leque de condições climáticas que se fazem sentir no território português:

Quadro 2. Grelha de Avalição Climática

frio

temperatura máxima média

< 14.8șC

fresco

temperatura máxima média

>= 14.8șC

temperatura média mensal

< 17.0șC

confortável

temperatura máxima média

<= 26.7șC

temperatura média mensal

>= 17.0șC

quente

temperatura máxima média

> 26.7șC

   

<= 31.8șC

muito quente

temperatura máxima média

> 31.8șC

 

Afigura-se adequada para o efeito, a utilização de temperaturas médias apuradas mês a mês, tendo em conta a inconstância do clima e visando a especificação de edificações para condições médias e não para condições extremas.

A humidade, ausente desta grelha de avaliação, é incluida nas condições fixas adiante expressas, o que se considera aceitável numa primeira aproximação em que se pretende simplificar a recolha de dados sobre o clima a avaliar.

As temperaturas de fronteira entre o tempo frio e o fresco, enquanto máxima média e entre o fresco e o confortável enquanto média mensal, correspondem à temperatura interior de um abrigo de referência, em que se igualam as temperaturas do ar e radiante média no limiar inferior da zona de conforto, descontando 1.5șC, valor atribuido aos ganhos internos em edifícios correntes sem cuidados especiais de protecção térmica na sua envolvente.

Os limiares inferiores de conforto térmico seleccionados, respectivamente 16.3șC e 18.5șC, pressupõem uma humidade relativa rondando os 70.0% e o ar calmo (velocidade rondando os 0.1 m/s).

Nestas condições climáticas, eles correspondem, na escala DISC de Gagge (Marcus e Morris, 1980) a índices de satisfação de 70.0% e 80.0% da população, atribuindo à actividade e vestuário correntes em edifícios de habitação ou serviços, os valores de 1.0 Met e 0.9 Clo.

Nestes termos, perto dos 19.0șC o clima atinge o pleno conforto, convidando-nos a abrir francamente a casa para disfrutarmos agradáveis condições exteriores.

A temperatura de fronteira entre o tempo confortável e o quente situa-se no limiar superior de conforto térmico, considerando a mínima abertura ao exterior que assegura a dissipação dos ganhos internos. O limiar seleccionado, 26.7șC, pressupõe neste caso uma humidade relativa rondando os 50.0% e corresponde a um índice de satisfação de 80.0%. Mantêm-se os restantes parametros anteriormente fixados para a zona de conforto, salvo o valor que se atribui a um vestuário mais leve, 0.6 Clo.

A temperatura de fronteira entre o tempo quente e o muito quente, 31.8șC, situa-se tal como no caso precedente, no limiar superior de conforto térmico, mas pressupõe uma humidade relativa rondando os 35.0% e corresponde a um índice de satisfação mais baixo, 70.0%.

 


3.2. Aplicação da Grelha de Avaliação Climática

A aplicação mês a mês da grelha definida, aos correspondentes valores médios das temperaturas observadas num local, conduz a uma distribuição numérica dos meses pelas cinco categorias climáticas estabelecidas (a,b,d,e,f no Quadro 3).

Estas cinco cetegorias podem ser reduzidas a três (c,d,g no Quadro 3), agrupando as categorias frio e fresco num período FRIO e as categorias quente e muito quente num período QUENTE.

Multiplicando por 25/3 o número de meses que caiem em cada uma destas três categorias, obtem-se a distribuição percentual das situações de conforto ao longo do ano mostrada no Quadro 3, suceptivel da representação gráfica que consta da Quadro 4.

Quadro 3. Avaliação de Condições Climáticas que ocorrem em Portugal

 

O Quadro 3 e o Quadro 4 resultam da aplicação desta grelha de avaliação ao clima de Portugal, utilizando as Normais Climatológicas de 24 Estações distribuídas pelo Continente, Açores e Madeira (Serviço Meteorológico Nacional,1970). Tenha-se em conta no entanto que, a malha larga das Estações Climatológicas não cobre convenientemente muitas situações existentes no território português. Uma confirmação no local afigura-se pois necessária.

Quadro 4. Gráfico da Avaliação das Condições Climáticas que ocorrem em Portugal

 


3.3. Comentários à Avalição do Clima de Portugal

Constata-se a predominância da época fria no território português, o que parece contrariar a impressão de que o clima de Portugal é ameno.

Tenha-se em conta no entanto que, a escala de conforto adoptada é relativa e que, como se pode destrinçar no Quadro 3, o período FRIO se encosta bastante à zona de conforto, sendo geralmente mais fresco do que frio.

Observa-se que o período FRIO vai diminuindo em extensão e intensidade à medida que se caminha para as latitudes mais baixas: para baixo no Quadro 3 e para a direita na Quadro 4. Ressaltam como excepções, os microclimas influenciados pela altitude e pelo relevo, como nos casos de Guarda, Penhas Douradas ou Sintra.

São legíveis, no histograma da Quadro 4, climas extremados para o interior, nos quais, a aplicação da grelha adoptada chega a produzir distribuições em que o período FRIO contrasta com o QUENTE, sem período CONFORTÁVEL intermédio: por exemplo em Moncorvo ou Castelo Branco.

Para o litoral, por influência da imediata proximidade do mar, registam-se climas menos extremados, mais confortáveis e menos quentes, como nos casos de Figueira da Foz ou de Monte Estoril. Idêntica inflluência, pela insularidade, combinada com a latitude e a exposição, deverá contribuir para o conforto dominante no Funchal.

 


Bibliografia

Moran J. e Morgan, L. (1994). Meteorology. The Atmosphere and the Science of Weather. Macmillan College Publishing Company,Inc. N.Y..

Serviço Meteorológico Nacional (1970). O Clima de Portugal, XIII, Lisboa.

Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica (1990-1991). O Clima de Portugal, XLIX, vol. s 1 a 6. Lisboa.

Loftness, V. (1982). Energy Graphics: Climate Data Aplications in Architecture. Carnegie-Mellon University, Pittsburg.

Simões, F. (1994). Clima e Conforto. Uma Avaliação Climática Expedita Energias Limpias en Progresso. Vol 1 621-628. AEES / ISES. Vigo.

Fontes dos Quadros e das Figuras

Quadro 1

Watson,D e Labs, K. (1983).Climatic Design. Mcgraw Hill Book Company, New York.

Quadros 2, 3, 4

Simões, F. (1994). Clima e Conforto. Uma Avaliação Climática Expedita Energias Limpias en Progresso. Vol 1 621-628. AEES / ISES. Vigo.

Figura 1

Fevrot, Ch. e Leroux, G. (1976). Meteorologia. Editorial Almedina, Coimbra.